DOCES lembranças da passada glória,
Que me tirou Fortuna roubadoura,
Deixai-me repousar em paz uma hora,
Que comigo ganhais pouca vitória.
Impressa tenho na alma larga história
Deste passado bem que nunca fora;
Ou fora, e não passara; mas já agora
Em mim não pode haver mais que a memória.
Vivo em lembranças, morro de esquecido,
De quem sempre devera ser lembrado,
Se lhe lembrara estado tão contente.
Oh, quem tornar pudera a ser nascido!
Soubera-me lograr do bem passado,
Se conhecer soubera o mal presente.
LUÍS DE CAMÕES (1524? - 1580) - Sonetos de Luís de Camões (escolhidos por Eugénio de Andrade)
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