O sol, que dá nas ruas, não dá
No meu carinho.
Felicidade quando virá?
Por que caminho?
Horas e horas por fim são meses
De ansiado bem.
Eu penso em ti indecisas vezes,
E tu ninguém!
Não tenho barco para a outra margem,
Nem sei do rio
Ah! E envelheceu já tua imagem
E eu sinto frio.
Não me resigno, não me decido,
Choro querer...
Sempre eu! Ó sorte, dá-me o olvido
De pertencer!
Enterrei hoje outra vez meu sonho
Amanhã virá
Tornar-se triste por ser risonho,
E não ser já.
Inútil brisa roçando leve
Já morta flor,
Saudando a um bem que não se teve
Vácuo sem dor,
Triste se é triste, e de o ser não finda
Quando é conforto
Como a mãe louca que embala ainda
Um filho morto.
[FERNANDO PESSOA (1888 - 1935)]
(in "Do Infinito Mar Do Meu Desejo")
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