No
início havia um deus da noite e da tempestade, um ídolo negro sem olhos, nu e
coberto de sangue. Mais tarde, nos tempos da república, havia muitos deuses e
suas esposas e crianças, camas que rangiam e raios que explodiam de modo
inofensivo. No fim apenas neuróticos supersticiosos traziam nos bolsos pequenas
estátuas de sal, representando o deus da ironia. Nessa altura não havia um deus
que sobressaísse.
E
então vieram os bárbaros. Também eles tinham em grande conta o deus da ironia.
Esmagá-lo-iam com os calcanhares e usá-lo-iam para decorar os seus manjares.
ZBIGNIEW
HERBERT (1924 – 1998)
Escolhido
Pelas Estrelas – antologia poética
(apresentação e versões de Jorge Sousa Braga)
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