Os charcos formavam um dominó decapitado
de edifícios, dos quais um era o torreão, que me contaram na infância, de uma
só janela, tão alta como os olhos da mãe quando se inclinam sobre o berço.
Perto da janela pende um
enforcado que se balanceia sobre o abismo de eternidade, uivando de espaço. SOU
EU. É o meu esqueleto de que já não restam senão os olhos. Tão depressa riem
como se me entortam, ou VÃO COMER UMA MIGALHA DE PÃO NO INTERIOR DO MEU CÉREBRO.
Abre-se a janela e aparece uma dama a pôr polisoir nas unhas. Quando as vê
suficientemente afiadas arranca-me os olhos e atira-os para a rua. Ficam-me as
órbitas sozinhas, sem olhar, sem mar, sem desejos, sem frangos, sem nada.
Uma enfermeira vem sentar-se ao
meu lado na mesa do café. Desdobra um jornal de 1856 e lê com voz emocionada:
<<Quando os soldados de
Napoleão entraram em Saragoça, na VIL SARAGOÇA, só encontraram o vento pelas
ruas desertas. Só num charco grasnavam os olhos de Luis Bunuel. Os soldados de
Napoleão acabaram-nos à baioneta.>>
LUIS BUNUEL (1900 – 1983) Os Poemas de Luis Bunuel
(organização d J.F.Aranda)(tradução de Mário Cesariny)
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