segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

ADOLESCENTE

A íntima cruzada da sua alma dispersa,
o sangue
insuportável, possuíam-no.
E era como um coro, rouco, gregoriano,
esse cavalgar perdido no deserto, esse amalgamar
de cruéis erros de cálculo, de posses
repetidas pela insónia.

Testava o tamanho do seu membro
como quem pretende contratar para si a morte,
ou temia esse glandular inflado do desejo
nas sevícias da infância
no corpo que cresce só e se repete na noite
numa fala só, isolada do mundo.

Tornado que foi público
o seu acesso ao sexo, a sua forma de estar por entre
a gente e nesse estranho lume caldeado,
tornaram-se os testículos
em sinais de fogo que pouco a pouco
se cobriam de água, impura,
magoada.

E depois disso, diz-se, nunca mais sorriu.

[ARMANDO SILVA CARVALHO (1938)]
(De Amore)
(in Poemário Assírio & Alvim 2013)

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